Conheci o Luciano em
agosto de 1991. Foi Letícia quem nos apresentou. Ele usava cabelos compridos,
um pouco cacheados, e tinha olhos bem pretos e luzidios. Era alto, muito branco
e excessivamente magro. E era mais velho uns oito do que eu, que estava com 26.
Quando cheguei à casa da Letícia, após o trabalho, ela estava de saída. Disse:
— Vem comigo. Vou te
apresentar uma transa minha que é bem interessante.
Letícia tinha várias
“transas”, mas não se fixava em ninguém. Fomos até o apartamento de Luciano,
que ficava próximo à faculdade de medicina, e que ele dividia com o Caetano, um
estudante de medicina cuja família era do interior. Caetano era quem pagava
todas as contas da casa, já que o Luciano era “artista plástico desempregado”. Faziam
as principais refeições – almoço e jantar – no bandejão da faculdade. O resto
era composto por biscoitos de chocolate, cigarros e bebidas. Luciano, porém,
não gastava nem um centavo com cigarros, visto que sua marca preferida, ou
melhor, exclusiva, era a famosa “Simidão”. Se lhe dessem cigarros, ele fumava,
se não...
Naquela época eu era
fumante, embora fumasse muito pouco, cerca de três ou quatro cigarros por dia. Apesar
de fumar “Simidão”, Luciano não fumava pouco. Seu apartamento era bastante frequentado
por estudantes de medicina colegas do Caetano e também por outros amigos. Fumavam
tanto, que o ambiente chegava a ficar com uma “cortina de fumaça”, literalmente.
Também jogavam cartas e bebiam uísque, de modo que a sala do apartamento do
Luciano lembrava mais um cassino clandestino do que a residência de
universitários.
Luciano tinha um filho
de quatro anos, fruto de um relacionamento que mal durara um ano. Talvez por
isso ele não se empenhasse muito em procurar – e encontrar – trabalho.
Recusava-se a pagar pensão. De qualquer forma, o menino, louro, de olhos muito
azuis, um verdadeiro anjinho, passava os finais de semana com ele.
Na segunda vez que vi o
Luciano, eu estava sem a Letícia. Fui direto à casa dele, procurá-la, mas ela
não estava lá. Ele me convidou a entrar. Mostrou-me alguns trabalhos que fizera
ainda na faculdade de artes plásticas, e que pareciam ser uma espécie de tesouro
seu, guardado a sete chaves. Caetano não estava em casa, mas chegou pouco
depois. E fingiu naturalidade quando eu e Luciano começamos a nos beijar.
Perguntei ao Luciano, como quem não quer nada, se
ele e a Letícia tinham algo sério.
— Eu e Letícia? O que nós tivemos foi apenas uma
transa.
Por causa das
contínuas, quase diárias, reuniões dos amigos de Luciano e Caetano, e por causa
das visitas do filho nos finais de semana, tornava-se bastante difícil às vezes
encontrar o Luciano. Ele quase não saía de casa, por motivos óbvios, e era
sempre eu que ia vê-lo, depois do trabalho ou em algum final de semana. Resolvi
o problema mudando os meus horários.
Uma noite em que a
“reunião” prolongava-se ad infinitum,
o Caetano pediu licença e foi para o seu quarto, alegando que precisava dormir
cedo, pois no dia seguinte deveria estar no hospital – ele era “residente” – às
sete horas da manhã, horário que, para os outros simples mortais que ali estavam, ainda era
madrugada. A informação acendeu uma luzinha no fundo do túnel do meu cérebro.
Ao descobrir que o
Caetano precisava estar na “residência médica” pelo menos quatro dias na semana,
constatei que eram quatro dias que ele não estaria em casa às sete horas da
manhã. Estava tudo resolvido!
Passei a ver o Luciano
de manhã cedo, antes de ir para o trabalho. Eu pegava às nove horas da manhã,
de forma que, entre sete e oito e meia, lá estava eu, batendo ponto no
apartamento do Luciano. Eu nem me importava de acordar mais cedo: tinha o
Luciano só para mim, longe daquela “gang” de amigos, e, de quebra, livre do
anjinho de cachos dourados. O próprio apartamento era só nosso, nesse curto
espaço de tempo. Fazíamos café da manhã, tomávamos banho juntos e gastávamos o
resto do tempo na cama larga, de casal, do Luciano, o que frequentemente me
fazia chegar atrasada no trabalho, e sempre de cabelos molhados. O mais
interessante é que meus cabelos molhados àquela hora não levantavam nenhum tipo
de suspeita no trabalho, nenhuma gracinha, como ocorre quando as mulheres, que
chegaram pela manhã de cabelos secos, retornam do almoço com os cabelos
molhados. Nem mesmo para a minha melhor amiga no trabalho eu não contava uma
vírgula, pois receava botar tudo a perder, se os reais motivos dos meus atrasos
fossem descobertos.
Estávamos, eu e o
Luciano, praticamente em lua-de-mel. Quando eu chegava, às sete e pouco da
matina, ele ainda estava dormindo profundamente. Então, eu ganhei uma cópia da
chave. Entrava sem fazer barulho e me certificava de que o Caetano não estava
mesmo em casa. Ia pé ante pé até o quarto do Luciano e me enfiava debaixo das
cobertas. O Luciano se enroscava em mim e ia tirando-me a roupa lentamente. Mordia-me
os mamilos, lambia meu pescoço e ia descendo sua língua molhada e quente até o
meu clitóris. Depois, me penetrava calmamente, como se tivéssemos o dia todo
para isto.
— Lu, is... – fiquei meio em dúvida se pedia ou não o isqueiro, estava meio querendo parar de fumar.
— Isqueiro?!
Ele acendeu meu cigarro Carlton, de filtro suave, e ficamos os dois nus e fumando, curtindo a preguiça pós-sexo, antes de irmos para o chuveiro.
— Lu, is... – fiquei meio em dúvida se pedia ou não o isqueiro, estava meio querendo parar de fumar.
— Isqueiro?!
Ele acendeu meu cigarro Carlton, de filtro suave, e ficamos os dois nus e fumando, curtindo a preguiça pós-sexo, antes de irmos para o chuveiro.
A nossa “transa” ia
muito bem, obrigada. Até quando entramos no terceiro mês, quando, sem quê nem
para quê, ele passou a falar muito na ex, a mãe do garoto. Primeiramente com
rancor e mágoas, mas depois com certo saudosismo, nos momentos em que relatava
histórias da intimidade deles. Até que progressivamente o assunto principal das
nossas conversas, no pouco tempo de que dispúnhamos, passou a ser sempre e
invariavelmente a ex do Luciano.
Estávamos em meados de
janeiro de 1992 e o Luciano faria aniversário no início de fevereiro. Preparei a
despedida organizando uma reunião – mais uma e, para mim, a última – com a “gang”
para comemorarmos o aniversário do Luciano. Caetano havia arranjado uma
namorada, que me ajudou com os preparativos: arrecadamos dinheiro entre os
rapazes para comprar as bebidas e os salgados. O bolo foi por minha conta. Encomendei
um de chocolate que o Luciano adorava. A “festinha” foi muito boa. Teve até
balão e velinha.
Foi a última vez que vi
o Luciano. Ele não tinha telefone em casa, e também nunca me pediu o meu
número. Não fazia ideia onde eu morava ou trabalhava. Soube depois que andou
perguntando por mim para a Letícia. Outros exageravam, dizendo que “o cara está
mal”, e que eu o tinha “deixado na pior”. Mas acho que, pouco tempo depois, ele
me esqueceu.
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